Os dois papas
Assisti ao filme Dois Papas com minha esposa. Estava gostando bastante do enredo até perceber que o título estava equivocado. Devia chamar-se O Papa. Isto porque quase nada trata de Ratzinger, ao passo que detalha com bastante cuidado a vida pregressa de Bergoglio. Aliás, ainda bem, pois do pouco que se narra a respeito de Ratzinger, é para fazer colar a pecha de que é um solitário, um chato e, de uma maneira muito desonesta e desrespeitosa, um nazista. Homem tímido e gentil que é, se assistiu o filme, deve ter ficado muito abatido. Bergoglio é apresentado como virtuoso homem do povo, simpático, alegre, ligado aos pobres, atormentado apenas por sua própria postura diante da ditadura e do celibato. Ratzinger em oposição é um bufão excêntrico, ganancioso por poder e ensimesmado. Qualquer menção ao seu passado intelectual, seu trabalho de bastidores junto a João Paulo II, seu apoio à vários escritores controversos como Leonardo Boff foi completa e sistematicamente ignorado. Nem a atuação sempre magistral de Sir Antony Hopkins pôde desfazer a sensação de que o filme trata apenas de um papa. Hopkins chega a gritar para aparecer no filme, coisa que os próximos de Ratzinger alegam ser impossível. Curioso notar que, apesar de tudo, se houve alguma mudança na Santa Sé, esta só se deu por sua decisão, ao abdicar do papado, abrindo assim a possibilidade de novo conclave. Logo, se há mudança quem a dispara é Ratzinger. Pena que na construção deste filme, o viés ideológico se sobrepôs não somente à arte, mas também à realidade. Desnecessário e indigno é denegrir um para enaltecer outro. Não houvesse polarização neste momento, seria possível enxergar virtude num e noutro. Com esse cuidado, a partida de futebol terminaria mais leve e alegre, e não amarga e mambembe como foi.
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