Esportes Corporativos


Certa vez, ouvi uma analogia que o brilhante Rubem Alves fez sobre o casamento, o qual ele comparou com dois esportes distintos: - o frescobol e o tênis. Em seu texto ele explicava que para alguns, era como se os cônjuges estivessem a jogar tênis, onde o objetivo é jogar a bolinha de forma que torne impossível ao companheiro rebatê-la, dificultando ao máximo sua reação, ou seja, obrigando-o a deixar "a peteca" cair. Já por sua vez outros, com casamentos mais bem sucedidos, comportam-se como se o casal jogasse frescobol, cujo objetivo é o de devolver a bola "o mais redonda" possível, facilitando assim a próxima jogada do oponente, que neste caso, é melhor identificado como parceiro. Achei genial, pois resume de uma forma muito simples o comportamento de alguns cônjuges em seus respectivos relacionamentos.

Entretanto, gostaria de emprestar esta mesma analogia para usá-la noutras paragens, noutro contexto: - nosso mundo corporativo. Há quem defenda que o melhor ambiente para se garantir um desempenho otimizado de um time é o de colocar as pessoas em conflito, disputando entre si a melhor posição. O resultado, segundo nossa analogia, é que este time joga tênis, buscando dificultar ao máximo a próxima jogada de seu colega, (ou oponente). Não raro, acontecem situações em que estes profissionais fecham-se em seus próprios silos, refratários a qualquer pedido de ajuda. Tampouco oportunidades de sinergia são aproveitadas. De parceiros partimos para oponentes e, por vezes, de oponentes para inimigos.

Entretanto, há gestores que conseguem criar uma atmosfera de trabalho tal, que este flui tranquilamente, porém com um desempenho invejável. E não estou falando aqui de um ambiente com pouco trabalho. Muitas vezes mesmo com pouco trabalho é possível viver num ambiente que mais parece um inferno. De igual modo, podemos ter um local cheio de trabalho, mas repleto de paz. Neste caso, parece que todo o time está a jogar frescobol, facilitando ao máximo a próxima jogada.

Não irei utilizar este espaço aqui para advogar qual é o melhor modelo para o mundo corporativo. Entretanto, gostaria de exercitar algumas de minhas próprias experiências sobre este tema.

Trabalhei há muito tempo numa empresa em que o diretor fomentava regularmente a competição interna, utilizando para isso a gestão por conflito. Não raramente, presenciei situações em que ele forneceu diretrizes opostas entre seus gerentes subordinados, no afã de promover uma ampla discussão dos assuntos. Sua expectativa, imagino, seria fazer com que as questões fossem amplamente discutidas e, em tese, após o conflito, a melhor decisão ser tomada.

Há alguns problemas nesta abordagem. O primeiro que percebíamos é que os times dificilmente se ajudavam. Um problema trivial que deveria levar minutos para se resolver, levavam por vezes semanas. Tudo isso por conta da interação limitada entre os grupos, que se dividiam em feudos, cada qual de acordo com a proposta de seu gestor. E o pior, é que num caso extremo, pudemos ver um destes gerentes dando ordens expressas a seus subordinados para não ajudar o outro time, pois afinal de contas, tratava-se "do outro time". Como consequência, a empresa teve diversas dificuldades, com sua área de negócio sofrendo o efeito colateral desta crise interna.

Outro problema que pudemos notar, foi a inexistência de ações em sinergia. Com cada um buscando  seus próprios objetivos, era impossível a interação em parceria num único  objetivo 'cross'. Para se alcançar este alvo, este mesmo diretor tinha de tutelar pessoalmente o processo afim de garantir que a guerra de 'egos' não atrapalhasse. A tendência natural dos times internos era sempre ao imobilismo e pouco espaço para a criatividade e espontaneidade.

Em contrapartida, trabalhei noutra empresa em que o diretor incentivava um ambiente de total cooperação, facilitando ao máximo as interações. Não que inexistissem conflitos, os  quais reputo inevitáveis em toda relação humana. Mas em suas poucas ocasiões, traziam crescimento para o grupo, aprendizado, agregando para o objetivo final. E por tratar-se de um conflito benéfico, não haviam indisposições entre as pessoas. Ao contrário, havia muito companheirismo e sinergia. Lembro-me de ter encontrado uma dificuldade num cliente certa vez e, com um único telefonema, consegui fechar uma dinâmica de reuniões em que um colega me apoiaria em troca de eu apoiá-lo em seu projeto. Resultado: - crescemos nós dois, ambos tratando de clientes diferentes, com necessidades diferentes e portanto soluções diferentes.

No filme Uma Mente Brilhante, há um momento especial, retratado por Russell Crowe, em que seu personagem, John Nash, um grande matemático da Universidade de Princeton, tem uma epifania, concluindo que a teoria tradicional de Adam Smith está incompleta ao afirmar que o interesse individual, com cada um trabalhando apenas para si e somente para si, produz  progresso. No filme se relata a dura realidade, em que quando todos querem o mesmo objeto de desejo para si, frequentemente anulam seus esforços nas inevitáveis brigas. De fato, só há progresso se as ambições pessoais coexistem com as ambições do grupo. Ou seja, só quando um time considera o melhor para o próprio time é que há progresso.

Diante disso, deixo a você meu caro leitor, a tarefa de identificar em seu ambiente corporativo: - qual esporte se pratica em sua empresa?

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